quarta-feira, dezembro 07, 2011

Seguindo os 16 dias de ativismo pelo #FimDaViolênciaContraMulher

Nasci numa família pobre, mas que com muito trabalho conseguiu conquistar um lugar ao sol. Meu pai veio de baixo, até conseguir formar-se e ir trabalhar no banco, aí nossa vida melhorou. Sempre gostei de escrever, quando dei-me conta já havia optado pela carreira jornalística. Fui morar noutra cidade, tendo de aprender a me virar sozinha, tomar minhas decisões, enfim...
Quando me tornei independente, não precisava de muitas opiniões para decidir o melhor caminho a seguir, avaliava com a razão e o coração. Para encurtar um pouco minha história fui noiva por alguns anos e não deu certo. Foram vários motivos que levaram ao rompimento, o mais marcante, o fato de eu não ter certeza se queria me converter a mesma fé professada pelo meu ex-noivo. Fiquei morando em outra cidade longe da família até conseguir um emprego em outro jornal. Lá conheci várias pessoas, fiz muitos amigos e encontrei um bom companheiro. Ficamos juntos algum tempo, tive duas gestações que foram interrompidas por abortos espontâneos. Fiquei muito mal com isto e o relacionamento pereceu.
Estava decidida a focar na minha carreira jornalística, no meu trabalho e nada mais. Mudei de cidade, de estado. Acabei indo parar ainda mais longe da família e dos amigos queridos. Descobri que não ter a quem recorrer, precisar começar do zero, construindo novo círculo de amizade realmente não é fácil. A decisão estava tomada iria recomeçar... do zero se preciso.
Meu trabalho era tudo o que eu queria. Estava muito feliz. O que não andava lá nas melhores condições eram os amores. Reatei com meu ex e acabei mais de uma vez. Íamos e vínhamos... nada mudava ou será que tudo voltava ao que era? Não sei bem. Decidi romper de vez.
Novos amigos, novos amores. Foi quando o conheci através do próprio trabalho, pois ele era uma das minhas fontes. Eu sei, não devemos nos envolver com as fontes, é antiético, mas não resisti. Namoramos por um tempo. Então descobri minha primeira gravidez. Fiquei com receio de contar, de ele pensar que eu o estava pressionando. Fui deixando as coisas rolarem. Acordei com o chefe que ao final da gestação eu fosse ter meu filho junto da minha família. Acertamos a demissão.
Contei ao meu, então ex-namorado, que estava grávida, que voltaria a minha terra. Ele assumiu o bebê prontamente. Ficamos em contato, mas segui minha vida, agora junto daqueles que amava tanto. Encontrei um novo amor, mas como vocês já devem ter ouvido milhares de vezes não está fácil manter um relacionamento sério hoje em dia. Rompemos após quase um ano.
Nesta época o pai do meu bebê convidou-me para ir até sua cidade, levar o filho para que ele conhecesse. Aceitei e voltei. Ficamos alguns dias de férias, então ele me fez a proposta que me surpreendeu, viver e criar nosso filho juntos. Exitei por vários meses, até pensar em meu filho e no que eu o estava privando. Conversei com algumas pessoas em quem confio muito, mas a decisão já estava tomada. Fui morar com ele e meu filho.
Voltei a trabalhar, cuidava da casa, do meu filho, das roupas do meu marido, da comida. Ele acreditava (e acredita) que faz muito me dando casa e comida. Aos poucos fui percebendo que sua mania militar de organização, silêncio, ordem, horários eram um traço forte de sua personalidade e que chocava-se diretamente com meu jeito livre de ser, coisa que, como boa aquariana refletia na minha desorganização e na minha preocupação em dedicar o máximo de tempo e atenção ao meu bebê. Isto de certa forma incomodava meu companheiro. Fui começando a perceber que sua mania controladora estava extrapolando o bom senso. Brigávamos muito! Por ciúme, por ele vir cheirando a bebida, por sua falta de paciência com o nosso filho, por suas puladas de cerca, por seu machismo.
Ele era tomado por acessos de raiva, gritava, xingava por que a comida estava ruim... enfim... eu me sentia um lixo. Então descobri que havia outra ex-namorada grávida. Ele fez questão de acompanhar toda a gravidez, acompanhava nas consultas médicas, ia visitar. Numa discussão grande por causa do novo bebê ele me bateu pela primeira vez. Bateu, me jogou no chão e foi embora.
Quando tentei conversar com ele mais tarde ele rebateu que não havia me batido, pois se o tivesse feito eu estaria toda quebrada. Conversei com uma amiga, ela me aconselhou a registrar queixa, eu não quis. Fiquei com vergonha porque a cidade é pequena e todos ficariam sabendo. Além disso, ele sendo policial como ficaria a situação? Tentei mais uma vez.
O problema é que as discussões iam ficando cada vez mais frequentes e sua atitude para encerrar o debate era erguer a mão. Até que ele me bateu, novamente. Decidi ir embora, voltar pra casa com meu filho e me afastar de todo aquele sofrimento. Ele começou a ameaçar tirar meu filho. Eu, por minha vez, tentei me consolar. Saí da casa dele e fiquei por um tempo na casa da mãe dele, a única família com quem podia contar nos momentos difíceis. Ela me ajudou muito cuidando meu bebê enquanto eu trabalhava, enfim.
Tentamos reatar mais uma vez... sem sucesso. Ou talvez com sucesso? Sei que muitos me julgarão e me chamarão de burra, como uma mulher com nível superior e independente apanha do marido e ainda assim tem dois filhos com ele? Peço que não me julguem, pois eu faço isso todos os dias, penso nos meus filhos e nos traumas que eles poderão vir a ter e me culpo por toda a violência que sofri. Ninguém mais precisa me dizer o quanto fui fraca, eu sei bem.
Quando contei a ele da gravidez ele enfureceu. Esbravejou, xingou e claro, me bateu mais uma vez. Eu já havia prestado queixa e pedido proteção para poder viajar com meu filho sem que ele me impedisse. Eu estava com dois meses de gestação, a agressão me fez faltar o trabalho e foi preciso contar a minha chefe todo o meu drama. Ela foi solidária comigo. Aos três meses tive um sangramento, mas conseguimos conter. O estresse com o meu ex não cessava. Acabávamos sempre discutindo quando ele vinha visitar nosso outro filho. Entre as acusações mais absurdas estava a de que o neném em meu ventre não era seu. Um tempo depois o médico recomendou-me repouso, tentava trabalhar de casa, mas não foi o suficiente. Comecei a perder líquido amniótico, era preciso repouso total. O obstetra desaconselhou a viagem para ter o bebê em minha terra natal. Meu segundo filho veio ao mundo com seis meses e meio de gestação. Está na UTI neonatal e graças a Deus está se desenvolvedo bem. Faz um mês e cinco dias que meu filhinho nasceu com pouco mais de um quilo. Ficará no hospital até ganhar peso. Todos os dias vou visitá-lo, levar o leite do meu peito, sentir seu cheiro e dizer o quanto o amo.
Durante o tempo em que precisei ficar em repouso a mãe do meu ex-marido muito me ajudou com os afazeres de casa e com meu outro pequeno. Tendo o apoio desta mãe não consigo compreender o caráter violento do pai dos meus filhos. Estou aguardando ansiosa poder ter meu filho nos braços e voltar pra minha terra. Vocês não imaginam o quanto sofri pensando na dor que seria perder meu filho! Como disse antes, tive dois abortos espontâneos e isso me traumatizou muito.
Agora aguardo ansiosa o momento de ir com meus filhos embora e me afastar deste homem que tanto amei, que tanto bem me fez (meus dois filhos) e que tanto mal me causou. Minha história é semelhante a muitas outras que acontecem, muitas vezes, bem próximas de nós. Eu não conseguia imaginar como uma mulher poderia se submeter aos maus tratos de um homem. Hoje, infelizmente, da maneira mais difícil eu sei. Mas consegui me reerguer!

PS.: Este depoimento foi criado por mim baseado na história de uma amiga que amo demais. É verdadeiro, mudei alguns detalhes e omiti os nomes para preservá-la. O bebê nascido prematuro está bem, ainda internado, mas bem.

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